sábado, 10 de fevereiro de 2007

Carta a Marie


A leveza das nuvens ,que trouxeram os teus versos até mim, permanece ainda na luz de um tempo em que menino me deixava amar por diligentes amantes em cujos corpos ainda hoje permaneço como o Estigma no lado de Cristo.

Sinto-me rodeado de lírios e ares que sulcando montes, respirados por ilhas me chegam do Atlântico – vou respirar ! Nada daquilo que penso deixa de ser um movimento celeste e todo o universo está contido no meu sonho. Sou vizinho de Sóis, líquido vizinho de Sóis e das Galáxias que não cabendo em mim foram ocupar outros lugares e formaram o infinito onde Deus já se encontrava vigilante e doce como uma árvore em qualquer caminho...

O menino de quem falas no teu poema sou eu, por inteiro, por tudo o que existe de mais sagrado, sou eu na magia das palavras da tua língua, sou eu devorado pelo saber do poeta.

Meu Deus, este é o meu corpo entregue à tribo dos famintos do amor! Quem procurou em minhas mãos o Sol? Quantos repousaram seus corpos cansados de entrega no mel da minha boca! A quantos me entreguei?
Eu sou das flores e dos ares, do sol e das estrelas. Há anos que fui prometido ao mar ao seu amor vigoroso – dele sou. Os homens são a ilusão necessária aos sentidos, são a roupagem do espírito demente de uma natureza tão ausente que do meu corpo nascem caricias e paixões.

o Homem ama porque é prometido à morte e tem a ilusão de a afastar no momento da entrega. Nós os poetas deixamo-nos amar porque já somos a eternidade de onde viemos e onde permanecemos. Somos a ilusão que a realidade mostra, somos a fome e a angústia, somos também a alegria de permanecermos sempre em tudo e em todos por uma vontade alcançada em cada abraço onde as lágrimas, como a chuva das tempestades, arrefecem um corpo que estremece no trovejar surdo do coração.

Igual ao poeta talvez o sonho, fecunda Primavera da realidade que traz a vida adormecida por noites sem lua e dias despidos de horas. Os teus versos são a essência invisível das coisas, os telhados brancos de levar e trazer águas que os horizontes de bruma soletram.

Não há ave nem profundezas do mar mais livres e agitadas que a alma de um poeta.

H. Levy

Sem comentários: