segunda-feira, 19 de março de 2007

Sofá Verde-água


Finalmente conseguiu fechar a porta de entrada do prédio, deixar lá fora a chuva torrencial e o vento que a tinham acompanhado desde a estação do comboio até casa.

Deixou a pasta no chão da cozinha, pois estava encharcada, despiu-se e tomou imediatamente um duche quente. Aquele dia na escola tinha sido muito perturbador. No final do teste do décimo segundo ano, um dos alunos, ao entregar o trabalho, disse-lhe, com olhar penetrante, que tinha gostado muito dos textos que Leonor aconselhara a leitura, que gostaria muito de discutir com ela o texto relacinado com Ética e Moral na Europa...

Que bom ter um aluno interessado, pensou Leonor. Antes de propôr um encontro com Marcos na biblioteca da escola, ele já lhe tinha pedido o número de telefone e ela sem se aperceber do perigo, escrevera-o, quase automaticamente, numa folha de papel que discretamente passou para as mãos de Marcos. Este saira da sala em silêncio com uma alegria imensa que se apoderou de todo o seu corpo.

Saiu do duche, vestiu o roupão, ligou os aquecedores, acendeu um cigarro e deixou-se ficar sentada no cadeirão verde-água. Pensava no cabelo longo e brilhante de Marcos, no seu sorriso quase estonteante e no facto inédito de ter dado o seu contacto telefónico a um aluno... apagou o cigarro no cinzeiro a seu lado, levantou-se e pensou em preparar um jantar leve. Quando ja estava na cozinha o telemóvel tocou. Era Marcos. Pedia desculpa por estar a ligar, ela respondeu-lhe que não tinha importância e convidou-o a partilhar com ela o jantar leve. Ele aceitou entusiasmado, ela deu-lhe a morada e desligou não sem antes ter ouvido até logo... um beijo...!

Leonor preparou o queijo,dispôs as carnes frias num prato antigo, cortou o pão e escolheu uma garrafa de vinho tinto que não abriu, vestiu umas calças e uma camisola de lã azul.

A casa estava aquecida, Leonor tremia. Um tremor que vinha da impossibilidade de organizar o pensamento, que a percorria e deixava em todo o seu corpo ansiedade.Só assim poderia explicar a si própria , no dia seguinte,a razão que a levara a que tudo aquilo estivesse a acontecer!

Marcos chegou com olhar brilhante, sorriso rasgado, mãos ligeiramente suadas... Leonor estendera-lhe a mão, quando o recebeu á porta, mas ele já se adiantara e beijara-lhe uma das faces. Leonor começou a falar sem se ouvir, não conseguia deixar de falar... falava da escola , dos textos de filosofia, de alguns dos quadros que tinha em casa... do cadeirão verde-água que pertencera à sua avó, contando até que a avó, que tinha sido professora de música, fora encontrada morta naquele cadeirão. Explicava agora que a avó Angélica morrera durante o sono... Entretanto Marcos abrira a garrafa de vinho, servira dois copos e olhava Leonor, pediu-lhe que ouvissem um disco que trouxera com ele. Ela calou-se, mostrou-lhe o lugar da aparelhagem e beberam de um golo só todo o vinho dos copos.

Marcos voltou-se na direcção de Leonor segurou-lhe a mão e segredou-lhe que a desejava, abraçando-a com os seus braços longos e fortes. No sofá verde-água, Marcos despia e beijava Leonor que se entregava serenamente, enchendo-o de beijos até ambos adormecerem quando o dia já nascia na cidade.
H. Levy

Sem comentários: