sexta-feira, 16 de março de 2007
Angélica
As folhas pautadas, onde os alunos tinham inscrito os seus ditados melódicos, estavam espalhadas por toda a sala.
A janela ficara aberta durante a noite. Não era previsível que a madrugada trouxesse mais do que a brisa habitual aos primeiros dias de Verão.
Angélica entrou na sala, acabara de acordar com o barulho da janela a bater contra as velhas portadas. Os óculos tinham ficado na mesa de cabeceira. Dirigiu-se para a janela e sem ver o que estava no chão pisou, com as suas pantufas amarelas, as folhas espalhadas .... Fechou a janela, energicamente, e voltou a pisar alguns papeis enquanto se encaminhava para o quarto. Pôs os óculos, voltou à sala. Quando viu os trabalhos dos seus alunos espalhados e pisados Angélica abafou um grito de espanto e dor. Iniciou imediatamente a recolha de todas as folhas que o vento tinha espalhado pela sala.
Agora havia um montinho de papeis organizados e arrumados dentro de uma pasta em cima da mesa da sala, mesmo ao lado de uma antiga fruteira de vidro que há muito estava vazia.
Angélica sentou-se no sofá verde-água que estava encostado ao piano, o seu coração batia tumularmente agitado, tirara os óculos, passara as duas mãos pela cara, ajeitara o cabelo. Tentou levantar-se para abrir a porta ao gato Elias que miava a pedir companhia, mas voltou a cair no sofá para não mais se levantar.
H. Levy
Nota: A morte de Angélica, professora de música, deixou na comunidade,nos alunos, nos docentes e amigos , um grande constrangimento e saudade.
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3 comentários:
a morte mesmo quando não fisica deixa sempre esse sentimento de perda, saudade, dor...
Parabéns H.
J
Lindo texto. Não percebi bem quem seria a Angélica, mas isso pouco importa
Não percebi se haveriaalguma ligação com a realidade ou se se trata de 1 experiência totalmente criativa... seja como for está uma bela peça de literatura... tal como o texto seguinte "sofá verde água", muito bem ligados. Queria mais!
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